Autores: Filipe Henrique Costa Lima, Rubens Ramires Sobrinho

1. Introdução

Estaca helicoidal é uma solução de fundação bastante empregada em obras de linhas de transmissão de energia e tem se tornado cada vez mais comum na construção civil devido à sua eficácia e versatilidade como fundações profundas. Tem se destacado como uma boa escolha na realização de provas de carga estática onde sua principal vantagem reside na capacidade de reutilização em diversos ensaios, o que a torna uma opção economicamente mais vantajosa em comparação a soluções tradicionais, como tirantes.

Contudo, o sucesso em sua instalação depende crucialmente de um fator muitas vezes subestimado: a realização, qualidade e precisão das sondagens que são realizadas para determinar as propriedades do solo em termos de sua resistência à penetração de um amostrador padrão. Uma sondagem que não condiz com a realidade do solo pode ter impactos significativos na estabilidade e desempenho da fundação, resultando em custos adicionais e atrasos na obra. Em linhas gerais, o conhecimento das propriedades do solo permite que se possa projetar fundações rasas ou profundas transferindo as cargas das edificações ou estruturas ao solo.

Por ser uma das técnicas mais baratas na investigação geotécnica, a sondagem SPT desempenha um papel crítico na determinação das características do solo em um local de construção, pois fornece informações essenciais sobre a composição do solo, sua resistência, compressibilidade, e outras propriedades geotécnicas fundamentais para o dimensionamento das fundações. Para as estacas helicoidais, em particular, a sondagem é vital, pois as estruturas dependem da capacidade do solo de suportar cargas verticais e horizontais.

A confiabilidade desses dados é o alicerce sobre o qual toda a estrutura será construída, e para isto é importante dar atenção neste tipo de ensaio, investindo no aprimoramento da técnica, diminuindo as incertezas no que diz respeito ao procedimento de ensaio, acompanhamento de um profissional experiente para verificar a forma de execução do ensaio, contar sempre com empresas especializadas e de boa reputação com equipamentos em condições de uso para obter as informações mais fidedignas possível.

Este artigo tem como objetivo destacar a relevância da condução de sondagens geotécnicas em projetos que incorporam estacas helicoidais como sistema de fundação. Neste contexto será apresentado um estudo de caso que ilustrará uma situação na qual, apesar de campanhas de sondagem realizadas, a instalação das estacas encontrou dificuldades significativas devido a discrepâncias entre os parâmetros de torque e comprimento de instalação, previamente definidos com base nos dados fornecidos nos boletins de sondagens, e a realidade encontrada em campo.

2. Revisão Bibliográfica

2.1 Estaca Helicoidal – História

As estacas helicoidais têm uma história que remonta a mais de 200 anos, tendo sido inicialmente adotadas como uma alternativa para solucionar problemas geotécnicos específicos (SILVA, B.C., 2014). Nos últimos 50 anos, observa-se um aumento significativo em sua aplicação em várias regiões do mundo, sendo amplamente adotadas como uma opção de fundação profunda (PERKO, 2009).

LITTLE (1961) descreve que as estacas helicoidais foram inventadas por Alexandre Mitchell e empregadas pioneiramente na fundação do Farol de Maplin Sands, localizado no Rio Tâmisa (Inglaterra), no ano de 1838. No contexto dessa estrutura, as estacas utilizadas apresentavam um diâmetro de 127 mm e uma extensão aproximada de 8 metros. As hastes das estacas iniciais eram produzidas em ferro ou madeira, enquanto as hélices eram exclusivamente de ferro (TSUHA, C.H.C., 2007).

A instalação era realizada através do método de aparafusamento, utilizando a força de trabalho humana ou animal. Para obter o torque necessário durante o processo de instalação dessas estacas, os trabalhadores ou os animais caminhavam sobre uma plataforma temporária (RANKINE, 1877).

Imagem 1 – Métodologia de instalação de estaca helicoidal no passado

Para os projetistas podem ser adaptadas para resistir a uma variedade de estruturas, independentemente do tipo de solo. Para os proprietários e construtores, sua instalação é simples e a capacidade de carga no final da instalação pode ser facilmente correlacionada com os valores de torque aplicados (SILVA, 2014).

A capacidade de carga destas fundações pode ser estimada com base nos dados obtidos a partir de sondagens do tipo SPT, permitindo o acompanhamento do processo de cravação até a conclusão da instalação. É possível realizar uma comparação entre os resultados de resistência obtidos pelo SPT e o torque aplicado, o que permite determinar a capacidade de carga geotécnica de forma eficaz (SILVA,2014).

No Brasil, as estacas helicoidais começaram a ser utilizadas no final da década passada para resistir à esforços de tração em torres de linhas de transmissão de energia elétrica e telecomunicações (TSUHA, C.H.C., 2007).

2.2 Dimensionamento

LIMA (2022) descreve que estaca helicoidal é um tipo de fundação profunda instalada em solo através de torque, constituída por haste metálica tubular ou maciça, com múltiplos helicoides soldados que são responsáveis por absorver os esforços aplicados na estrutura e transmiti-los ao solo.

A partir do dimensionamento mecânico e geotécnico, obtido através de modelos matemáticos reconhecidos em literaturas nacionais e internacionais, sãos definidos as propriedades mecânicas e geométricas da haste e das hélices (quantidade e posicionamento). Definido ainda os parâmetros de finalização, como comprimento e torque mínimo, que são necessários para atender os esforços transmitidos as estacas, sejam eles de tração e compressão. (LIMA, 2022)

LITTLE (1961) descreve que a estaca helicoidal penetra com mais facilidade e eficiência em solos que possuem características de argilas moles e areias fofas. O aumento da área da hélice pode proporcionar um melhor comportamento deste tipo de estaca em relação a outras em solos de baixa resistência. (TSUHA, 2014)

WILSON (1950) aborda em seu trabalho não apenas a realização de provas de carga em protótipos de estacas helicoidais, mas também destaca a importância dessas provas ao analisar os deslocamentos ocorridos durante o processo. Com isso, foi capaz de desenvolver uma teoria mais abrangente e, consequentemente, verificar a relação fundamental entre o torque aplicado durante a instalação dessas estacas e a capacidade de carga que elas são capazes de suportar. Esse estudo representou um avanço significativo no entendimento e no dimensionamento de estacas helicoidais, contribuindo para sua aplicação e desenvolvimento em diversas áreas da engenharia.

Segundo PERKO et al. (2000), existem três métodos para previsão da capacidade de carga de estacas helicoidais a esforços à tração e à compressão:

  • Torque de instalação
  • Método das capacidades de carga individuais
  • Método da ruptura cilíndrica

Estes mesmos autores sugerem que quando possível, a decisão do engenheiro deve ser baseada nos resultados dos três métodos, considerando a confiabilidade dos parâmetros e dados fornecidos.

PERKO et al. (2000) afirma que pelo método empírico baseado no torque de instalação, a capacidade de carga deste tipo de fundação é definida a partir da equação:

Q = K . T

onde:

Q = capacidade de carga

K = coeficiente de torque (recomendado pelos fabricantes de estacas)

T = torque final de instalação

O torque de instalação das estacas metálicas helicoidais proporciona uma maneira de avaliar a resistência do solo na profundidade das hélices, permitindo a utilização de um fator de segurança reduzido no cálculo da capacidade de carga, tanto em tração quanto em compressão. Geralmente, um fator de segurança igual a 2 é convencionalmente empregado para esse tipo de fundação. No entanto, a escolha adequada deve ser feita pelo projetista com base em sua compreensão das condições do subsolo, a precisão e confiabilidade do equipamento de medição do torque, a variação das cargas aplicadas e outros fatores relevantes (PERKO et al., 2000).

Quando a relação H/D (H – profundidade da hélice superior e D – diâmetro externo da hélice superior) é inferior a um valor crítico, a superfície de ruptura é composta por um cone que se encontra com o terreno e um cilindro localizado abaixo da hélice superior – denominado rasa. Por outro lado, quando a hélice superior é instalada a uma profundidade maior do que a crítica, a superfície de ruptura acima da hélice não se estenderá até a superfície do terreno, e essa configuração é denominada ancoragem profunda. (DAS, 1990)

O valor crítico sugerido por DAS (1990) é:

No método da capacidade de carga individual, considera-se que a ruptura ocorre com o deslocamento do solo próximo a cada hélice separadamente. Quando o espaçamento entre as hélices é aproximadamente igual a 3 diâmetros de hélice, os resultados obtidos por ambos os métodos se aproximam, (PERKO et al., 2000).

ADAMS e KLYM (1972) sugerem um método de capacidade de carga de tração individual em solos arenosos, conforme equação abaixo.

A capacidade de carga de tração total, fica:

No manual de projeto de HUBBEL (2003) tem-se que a capacidade de carga a tração relativa a cada hélice em argilas, em areia e solos intermediários pode ser estimada pelas expressões:

HUBBEL (2003) sugere o fator de capacidade de carga Nq para estacas helicoidais profundas em areia depende do ângulo de atrito do solo  que é dado por:

Em solos de natureza intermediária, quando os parâmetros de coesão e o ângulo de atrito do solo não estão bem definidos, HUBBEL (2003) propõe uma abordagem que envolve duas estimativas. Uma delas é realizada considerando o solo como coesivo, enquanto a outra considera o solo como não coesivo. O engenheiro deve então selecionar a estimativa que resulta na menor capacidade de carga, conforme determinado pelas equações apresentadas anteriormente.

O método da ruptura cilíndrica pressupõe que todo o volume de solo entre as hélices entra em mobilização quando a estaca é submetida a uma carga. Deste modo, a capacidade de carga é uma combinação da resistência ao cisalhamento do cilindro de solo formado entre as hélices e a capacidade de carga da hélice em sua superfície superior. No contexto deste trabalho, é empregado especialmente para a estimativa da capacidade de carga em tração, visto que essa é a aplicação mais comum no Brasil.

A estaca helicoidal é chamada de rasa quando a superfície de ruptura cônica acima da hélice de topo atinge o nível do terreno. Quando a razão H/D (H a profundidade da hélice superior, D é o diâmetro externo da hélice superior) apresenta um valor elevado, a superfície de ruptura acima da hélice de topo é local e não atinge a superfície do terreno, e nesta condição é denominada estaca helicoidal profunda (DAS, 1990).

Com base na hipótese de ruptura, considerando-se a resistência por atrito na haste, a capacidade de carga à tração de fundações por estacas helicoidais profundas (Qu) pode ser estimada pelas equações abaixo:

Para solos arenosos, conforme (MITSCH e CLEMENSE, 1985):

Para solos argilosos e siltosos, conforme (MOONEY et al., 1985):

Onde:

KANAI (2007) adotou o modelo de interação solo-estaca, onde a resistência é o somatório de duas parcelas: capacidade de suporte de cada hélice e atrito lateral do fuste com o solo. Propôs correlacionar os valores de SPT com a capacidade de carga por meio da equação:

Há uma ampla gama de estudos nacionais e internacionais que oferecem diversas abordagens para o dimensionamento e previsão da capacidade de carga em tração de estacas helicoidais proporcionando ao projetista a flexibilidade de escolher critérios bastante realistas para suas análises. Neste artigo, apresentou-se alguns dos métodos mais utilizados na instalação de estacas helicoidais, com foco particular nas práticas comuns adotadas no Brasil.

3. Implicações da ausência de sondagem em um projeto

A investigação geotécnica compreende um conjunto de ações para avaliar o comportamento das propriedades mecânicas dos solos, uma vez que é o solo quem irá suportar o peso do empreendimento em sua superfície.

Existem uma variedade de ensaios disponíveis para obter informações sobre as propriedades do solo, abordando diferentes condições. Para solos com maior capacidade de suporte de carga, podem ser empregados ensaios como o piezocone, “Deep Sounding” e sondagem SPT. Para solos de menor resistência, estão disponíveis ensaios como o “Vane Test”, o pressiômetro “Menard” e o kancometer. Nesta investigação pode-se adotar extração de amostras deformadas ou indeformadas para realização de ensaios laboratoriais como caracterização dos solos através de peneiramento com ensaio de sedimentação do material passado na peneira #200, LL (Limite de Liquidez) e LP (Limite de Plasticidade), ensaios de adensamento e ensaios triaxiais.

Cada qual permite dar respostas importantes para o dimensionamento das fundações, permite saber em que profundidade a fundação pode ser instalada e o dimensionamento do seu diâmetro.

A sondagem SPT e a sondagem rotativa são ensaios mais baratos no Brasil e mais difundidos entre os projetistas geotécnicos. Assim como outros tipos de sondagens tem como objetivo investigar as características do solo e da rocha presentes no local de implantação do empreendimento. Através da coleta de amostras, ensaios in situ e análises laboratoriais, obtém-se dados precisos sobre parâmetros como resistência, compressibilidade, permeabilidade, presença de água subterrânea, estratigrafia geológica e outras informações essenciais.

A falta de sondagem significa que o dimensionamento não contará com dados reais e confiáveis sobre as propriedades do solo, como sua capacidade de carga, resistência à tração, compressibilidade e coesão. Isso pode levar a um dimensionamento estimado e inadequado para as estacas helicoidais, resultando em estruturas que podem não ser capazes de suportar as cargas previstas. Além disso, pode-se afirmar que dimensionar as estacas com base em suposições imprecisas pode causar afundamentos excessivos ou até mesmo falhas estruturais.

Outros pontos importantes também podem ser elencados:

  • Riscos de instabilidade: sem uma sondagem apropriada, é difícil identificar e avaliar os riscos geotécnicos associados ao projeto, como a presença de camadas de solo instáveis, lençóis freáticos elevados ou solos expansivos. Esses fatores podem comprometer a estabilidade das estacas helicoidais e da estrutura em geral.
  • Aumento no custo: a falta de dados geotécnicos pode levar a retrabalhos e modificações na fundação durante a construção. Isso resulta em custos adicionais para o projeto, uma vez que as estacas podem precisar ser removidas e substituídas ou reforçadas devido à falta de capacidade de carga prevista. Além disso, os atrasos na obra também aumentam os custos operacionais e podem levar a penalizações contratuais.
  • Risco de segurança: dimensionar estacas helicoidais com base em informações geotécnicas imprecisas aumenta os riscos de segurança para os trabalhadores e para o público em geral. A instabilidade das estacas pode resultar em acidentes graves no canteiro de obras ou em danos à estrutura após a conclusão do projeto.
  • Desempenho inadequado da fundação: a falta de uma sondagem pode comprometer o desempenho da fundação ao longo do tempo. A instabilidade do solo pode levar a assentamentos diferenciais, rachaduras na estrutura e outros problemas que afetam a integridade da construção.
  • Litígios e responsabilidade legal: problemas decorrentes da falta de uma sondagem adequada podem resultar em litígios entre as partes envolvidas no projeto, como proprietários, empreiteiras e engenheiros. A falta de dados geotécnicos confiáveis também pode levar a disputas de responsabilidade legal.

Em resumo, a falta de uma sondagem ou uma sondagem imprecisa em um projeto que envolve estacas helicoidais assim como qualquer outro tipo de fundação pode ter um impacto cascata, afetando desde o dimensionamento e a segurança da estrutura até os custos e prazos de construção. É imperativo que os projetos que utilizam estacas helicoidais priorizem a obtenção de dados geotécnicos precisos por meio de sondagens apropriadas para garantir o sucesso do empreendimento e a segurança de todos os envolvidos.

4. A relevância de uma sondagem adequada

A falta de sondagem em projetos é apenas um dos problemas que podem contribuir para um mau dimensionamento da fundação. O impacto negativo de uma sondagem que não condiz com a realidade do solo pode ser significativo. Quando não são coletados dados geotécnicos suficientes, a equipe de projeto não dispõe das informações necessárias para entender as características do solo, resultando em uma estrutura que não atende aos requisitos de segurança e desempenho.

Além disso, problemas adicionais podem surgir mesmo quando a sondagem é realizada. Uma amostragem inadequada do solo, amostras de má qualidade, interpretação incorreta dos dados e falta de atualização das normas e diretrizes geotécnicas podem contribuir para erros de dimensionamento. As condições do solo variáveis em diferentes pontos do local de construção e a interação com estruturas existentes também são fatores a serem considerados.

É importante lembrar que as condições do solo podem ser influenciadas por variações climáticas e ambientais em algumas regiões, o que pode complicar ainda mais o dimensionamento e a estabilidade das fundações.

Portanto, para evitar problemas de mau dimensionamento da fundação é essencial que a equipe de projeto adote abordagens rigorosas, esteja atualizada com as melhores práticas, colete dados geotécnicos precisos e representativos, e leve em consideração todas as variáveis relevantes no local de construção.

Em cenários em que a geologia do local permanece desconhecida ou insuficientemente caracterizada, uma estratégia apropriada envolve a execução de sondagens mistas, que combinam ensaios de SPT e sondagens rotativas que oferecem uma visão mais abrangente da estratigrafia do solo e proporcionam insights quanto à presença de rocha íntegra em profundidades significativas, em consonância com os requisitos normativos estabelecidos pela NBR 6484 – Execução de Sondagens de Simples Reconhecimento dos Solos. A aplicação destas técnicas é imprescindível para embasar com precisão as decisões de projeto de fundação em circunstâncias geotécnicas complexas ou pouco exploradas.

A realização de sondagens por empresas idôneas e profissionais bem qualificados é essencial para garantir a qualidade dos dados e, consequentemente, o sucesso de projetos de construção e fundações. Essa necessidade se traduz em diversos benefícios.

  • Qualidade dos dados geotécnicos: empresas experientes empregam procedimentos rigorosos para coletar dados precisos sobre o solo. Isso é fundamental para dimensionar fundações de forma adequada e evitar problemas futuros.
  • Segurança estrutural: fundações mal dimensionadas devido a informações geotécnicas deficientes representam riscos graves para a segurança estrutural.
  • Economia a longo prazo: investir em sondagens geotécnicas de alta qualidade pode levar a economias a longo prazo. Projetos baseados em dados confiáveis tendem a ter menos retrabalho e modificações, reduzindo custos globais.
  • Evitar litígios: projetos com problemas geotécnicos podem resultar em litígios dispendiosos. Empresas idôneas assumem responsabilidade por seus serviços e minimizam conflitos legais.
  • Reputação da empresa: empresas respeitáveis valorizam sua reputação e entregam qualidade para manter a confiança dos clientes. Isso promove a concorrência saudável e melhora a indústria da construção civil.

É crucial também que as empresas contratantes dos serviços de sondagem sejam mais críticas em suas análises. Ofertas com preços excessivamente baixos podem indicar falta de compromisso com a qualidade e, eventualmente, levar a resultados insatisfatórios. Importante considerar a reputação, experiência e referências ao avaliar propostas, promovendo a excelência na indústria da construção.

5. Prova de Carga Estática

5.1 Conceito

De acordo com a NBR 16903 – Solo – Prova de carga estática em fundação profunda, prova de carga estática (PCE) é um ensaio de carga realizado com carregamento lento e progressivo em uma fundação, geralmente uma estaca, para determinar a capacidade de carga da fundação e seu comportamento sob carga.

Durante o ensaio, a carga é aplicada de forma controlada e monitorada, enquanto são registrados os deslocamentos correspondentes à medida que a carga é incrementada. Com base nas medições realizadas durante a PCE, é possível avaliar a capacidade de carga da fundação, a distribuição de carga no solo circundante e outros parâmetros relevantes para o projeto e a construção de fundações seguras e eficazes.

O objetivo é observar o comportamento da estrutura de fundação sob diferentes níveis de carga para determinar sua capacidade de suporte e verificar se ela atende aos critérios de segurança estabelecidos.

Os resultados esperados da PCE incluem a curva de carga versus deslocamento, que fornece informações sobre a capacidade de carga da fundação e sua resposta à carga aplicada. Além disso, a PCE pode ajudar a identificar possíveis problemas, como assentamentos excessivos ou rupturas no solo, fornecendo dados cruciais para o projeto e a construção de fundações seguras e eficazes.

5.2 Estaca Helicoidal – alternativa para estaca de reação

Estacas de reação em uma prova de carga estática são elementos estruturais ou geotécnicos, normalmente produzidos a partir de aço ou concreto, que são instalados no solo adjacente à estaca que está sendo testada. São projetadas para absorver as cargas aplicadas durante o ensaio e fornecer uma resistência confiável que permite a avaliação precisa da capacidade de carga da estaca de teste.

Desempenham papel crítico na preservação da estabilidade do sistema durante o teste, assegurando que as medições de carga sejam precisas e fielmente representativas das condições reais de carga e resposta do solo.

O dimensionamento dessas estacas assume papel crucial na condução do ensaio, pois deve incorporar considerações abrangentes, da qual pode-se citar os parâmetros geotécnicos, como o tipo de solo (areia, argila, silte, pedregulho, aterro etc.), a resistência do solo, o nível d’água e outros fatores relevantes. Tal abordagem garante que essas estacas apresentem a resistência necessária para suportar com eficácia o carregamento aplicado durante o teste, assegurando assim a integridade e a precisão dos resultados obtidos.

Nesse cenário, a estaca helicoidal se destaca como uma escolha técnica e funcional, e seu diferencial consiste em sua capacidade de ser dimensionada para suportar cargas substanciais, geralmente representando até 60% de sua capacidade máxima de carga. Essa estratégia de carregamento reduzido é deliberadamente implementada para mitigar deformações excessivas durante o teste de carga, uma consideração fundamental em ensaios de carga estática.

Pode-se dizer que sua principal vantagem em aplicações de prova de carga estática se dá pela capacidade de reutilização. Devido à sua resistência intrínseca e à capacidade de suportar cargas repetidas, pode ser empregada em múltiplos ensaios, resultando em economia de recursos considerável em comparação com a alternativa de utilizar estacas convencionais que frequentemente se tornam inutilizáveis após um único teste de carga estática.

Além disso, a estaca helicoidal apresenta benefícios adicionais, como facilidade de instalação, versatilidade em terrenos variados e menor impacto ambiental devido à ausência de escavações profundas. Esses atributos fazem desta solução uma escolha técnica sólida e economicamente eficiente para a criação de reações de carga em provas de carga estática.

6. Estudo de caso

Neste artigo apresenta-se um estudo de caso que descreve ensaios de prova de carga estática em estacas do tipo hélice contínua envolvendo o uso de estacas helicoidais como estacas de reação.

A abordagem do texto terá caráter não oficial quanto ao nome do empreendimento, do proprietário, local e nome da obra, dado que a obtenção de autorização do proprietário das informações pertinentes não foi factível.

6.1 Projeto

Em uma obra localizada na região sudeste do país, especificamente em uma cidade do interior do estado de Minas Gerais, destinada à construção de um edifício hospitalar, foram conduzidas duas campanhas de sondagem, sendo cada uma delas executada por empresas distintas. Uma dessas campanhas envolveu a realização de sondagens antigas, enquanto a segunda campanha compreendeu a realização de sondagens recentes. Importante observar que, embora os períodos possam apresentar incertezas, é relevante ressaltar que o intervalo entre essas duas campanhas foi superior a dois anos.

Ao comparar as duas campanhas, foi possível verificar a consistência entre as sondagens em relação às suas resistências e profundidades. Essa concordância indica que ambas as campanhas foram bem-sucedidas e que os resultados se corroboraram mutuamente.

Com base na confirmação desses resultados, o projeto de fundação foi desenvolvido adotando solução do tipo hélice contínua. Os diâmetros das estacas variaram, com diâmetros de 35 cm na área inferior do terreno e 70 cm a 80 cm na área superior adjacente. Além disso, estacas de prova de carga estática com diâmetros de 70 cm e 80 cm foram ensaiadas, identificadas como P1A e P1B, respectivamente e detalhadas a seguir:

  • Estaca P1A, possui 14,01 metros de profundidade conforme sondagem SP01, cujo SPT estava em um índice de 47 golpes para a penetração dos últimos 30 cm do amostrador.
  • Estaca P1B, possui 14,00 metros de profundidade conforme sondagem SP10, cujo SPT estava em um índice de 40 golpes para penetração dos últimos 30 cm do amostrador.

Destaca-se que os valores obtidos no ensaio SPT são consideravelmente elevados quando se trata da instalação de estacas do tipo hélice contínua, estacas pré-moldadas e trados mecanizados. Tais valores podem indicar a presença de solos muito resistentes ou rochas compactas, o que pode impactar significativamente o processo de perfuração e instalação desses elementos de fundação, requerendo abordagens e equipamentos específicos para lidar com essa alta resistência do solo.

As cargas a serem testadas eram de 400 tf para a estaca P1A e de 520 tf para a estaca P1B, ambas adotado fator de segurança igual a 2, conforme prescreve a NBR 6489 – Estacas – Prova de Carga Estática – Método de Ensaio.

Neste projeto, a montagem do sistema de prova de carga estática envolveu a instalação das estacas helicoidais no solo, a colocação das vigas de reação sobre elas e, em seguida, a aplicação controlada de carga sobre a estrutura a ser testada. Durante o teste, foram feitas medições detalhadas para avaliar a resposta do solo e determinar sua capacidade de carga. Entretanto, observou-se que o torque de instalação não atingia o mínimo estimado para resistir a carga de ensaio da estaca teste.

Para garantir uma capacidade de carga de 60 toneladas-força (tf) em cada estaca, era necessário aplicar um torque de 32.260 N.m (24.045 lbf.ft). No entanto, observou-se que o torque aplicado variava na faixa de 18.000 (13.276 lbf.ft) a 20.000 N.m (14.751 lbf.ft), independentemente de se tratar da estaca P1A ou P1B.

O projeto empregou um total de 8 estacas helicoidais para a estaca P1A e 10 estacas para a estaca de teste P1B. A profundidade das estacas helicoidais foi padronizada em aproximadamente 18 metros, situando-se 4 metros abaixo da ponta das estacas de teste.

Imagem 2 – Arranjo das estacas P1A
Imagem 3 – Arranjo das estacas P1B
Imagem 4 – Representação da estaca utilizada (P1A e P1B)

O processo de instalação (Figura 5) das estacas foi conduzido de maneira eficaz e precisa por meio da utilização de uma escavadeira hidráulica equipada com um rotor hidráulico, que desempenhou um papel fundamental na aplicação das estacas no solo de forma controlada e segura.

Além disso, a instalação contou com um componente essencial para garantir a qualidade do trabalho: torquímetro digital Incotep que permitiu a medição precisa do torque aplicado durante o processo de instalação das estacas, garantindo que os padrões de segurança e desempenho fossem atendidos de maneira rigorosa.

Imagem 5 – Instalação das estacas helicoidais durante o projeto

A Figura 6 apresenta a montagem do sistema de reação para a realização do teste de carga da estaca P207A. Este sistema não apenas incluía a viga, mas também contava com relógios comparadores que desempenharam um papel crucial durante o ensaio, uma vez que foram responsáveis por medir com precisão os deslocamentos.

Imagem 6 – Sistema de reação para prova de carga da estaca P1A

6.2 Resultados

No decorrer do ensaio, observou-se inicialmente que as estacas helicoidais se deslocaram no sentido ascendente em relação ao terreno, ou seja, estavam sendo arrancadas com deslocamentos singelos, cerca de 1 mm por estágio de carregamento.

Para os estágios subsequentes, com cargas maiores, as estacas helicoidais passaram a ter deslocamentos de 2 a 3 mm até a ruptura da estaca P1A. No 6º estágio de carregamento, cerca de 220 tf, passou a deslocar até atingir o deslocamento de ruptura prevista na norma NBR 6489 – Estacas – Prova de Carga Estática – Método de Ensaio, denotando ruptura da interação solo-estaca.

Na Figura 7, é apresentado o gráfico correspondente ao ensaio de carga realizado na estaca P1A, juntamente com o momento de sua ruptura. Cabe destacar que a carga de ensaio inicialmente estabelecida para este teste era de 400 tf.

Imagem 7 – PCE na estaca P1A – ruptura antes da carga projetada (fs = 2)

Já a Figura 8, apresentado o gráfico referente ao ensaio de carga conduzido na estaca P1B, que também exibe o momento de sua ruptura. Importante notar que, apesar da carga de ensaio inicialmente planejada para a estaca P1B ter sido estabelecida em 520 tf, a mesma rompeu com uma carga significativamente inferior, não atingindo sequer a metade do valor previsto.

Imagem 8 – PCE na estaca P1B – ruptura antes da carga projetada (fs = 2)I

Observa-se que os resultados obtidos foram consideravelmente abaixo das capacidades de carga projetadas com base nas sondagens correspondentes.

Para ilustrar, a estaca P1A, por exemplo, atingiu apenas um pouco mais da metade da carga de projeto esperada, aproximadamente 110 tf, em comparação com a expectativa de 200 tf. Da mesma forma, a estaca P1B, que tinha uma capacidade de projeto prevista de 520tf, alcançou apenas 210tf, o que equivale a uma carga de trabalho de 105tf, ou seja, menos da metade de sua capacidade original estimada de 260tf.

É evidente que, embora ambas as campanhas de sondagens realizadas neste projeto tenham produzido resultados coincidentes, nenhuma das estacas planejadas para instalação nas profundidades em que se supunha haver solo competente, conforme indicado pelas sondagens, conseguiu suportar as cargas projetadas.

Na situação da estaca P2, com um diâmetro de 35cm e profundidade de 6m, conforme indicado nos resultados das sondagens SP06 (recente) e SP07 (anterior), o ensaio de SPT revelou a necessidade de 20 golpes para penetrar o amostrador em 30 cm. Notavelmente, esta estaca se destacou ao ser a única a alcançar seu fator de segurança, estabelecido em 2, indicando que suportou uma carga máxima de 70 tf.

Um ponto relevante a ser considerado é que estava posicionada afastada das outras duas estacas, situada em um platô inferior com cerca de 14 m de corte de solo residual. Além disso, a estaca P2 apresentou apenas 6 metros de profundidade, com a ponta instalada em um SPT de 20 golpes para cravar os últimos 30 cm do amostrador. Esse contexto realça a singularidade e eficácia dessa estaca específica, dadas suas particularidades geotécnicas e a localização distinta.

7. Conclusão

Este estudo de caso traz à tona uma questão de importância crítica na geotecnia: a qualidade da sondagem do solo. Apenas a realização de uma campanha de sondagem não é suficiente para garantir o sucesso de um projeto geotécnico, principalmente quando se considera o uso de estacas helicoidais. O dimensionamento preciso dessas estacas é altamente influenciado pela caracterização do solo, e, portanto, a qualidade da sondagem desempenha um papel fundamental.

A utilização de empresas idôneas, equipes capacitadas e preparadas para realizar a sondagem do solo é uma necessidade imperativa. Este estudo ressalta que negligenciar a qualidade da sondagem pode levar a resultados imprecisos e a riscos significativos durante a execução do projeto. As estacas helicoidais, como exemplar, são particularmente sensíveis às características do solo, e uma avaliação inadequada pode comprometer sua capacidade de carga e, consequentemente, a segurança estrutural.

Além disso, os resultados apresentados demonstram que a análise em campo apenas reflete o estado real do solo conforme dimensionado anteriormente. Isso destaca a importância de uma caracterização precisa desde o início do projeto, para evitar surpresas desagradáveis no campo e garantir que a fundação seja projetada para resistir às condições reais do local.

Em resumo, este estudo se propôs a destacar que a sondagem do solo é um passo crítico e incontornável no processo de dimensionamento geotécnico. Investir em uma sondagem de qualidade não é apenas uma prática recomendada, mas sim um requisito essencial para garantir a eficácia, a segurança e o sucesso de projetos de engenharia civil, em especial aqueles que envolvem estacas helicoidais.

8. Agradecimentos

No contexto da finalização deste artigo, a Incotep – Sistemas de Ancoragem expressa seus sinceros agradecimentos ao engenheiro Rubens Ramires Sobrinho e, em particular, à empresa Cedro Engenharia, por sua generosa contribuição ao fornecer os dados fundamentais obtidos neste projeto. Sua colaboração e interesse em compartilhar essas informações foram muito importantes para o sucesso deste estudo, enriquecendo o conteúdo e a compreensão das questões abordadas.

9. Referências bibliográficas

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KANAI, S., A seismic retrofitting applications by means of multi-helix micropiles., 2007., Proceedings of the 23 U.S. – Japan Bridge Engineering Workshop, Tsukuba – Japan.

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